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quarta-feira, 22 de junho de 2016

Uma viagem entre Bragança e Abrantes, feita de bicicleta. Parte 4


(crónica de Carlos Bernardo)

Dia 3 15/10/2014 Murça do Douro - Trancoso

Chovia sem parar, estava frio e o pior, estava muito vento, vindo de Sul para Norte, ou seja, ia levar com ele na cara.

Adiei a minha partida o máximo que consegui (para além do mau tempo, também me estava a custar abandonar a minha casinha no Bairro do Casal ), na esperança que o tempo melhorasse. Era meio dia e não podia aguentar mais, apesar de esta ser a etapa mais curta, cerca de 50 km, era a mais inclinada, já que era sempre a subir até Trancoso, mesmo às portas da Serra da Estrela.

Lá segui, despedi-me da boa gente do Bairro do Casal e fiz-me à estrada, em direcção à aldeia de Freixo de Numão. Foi sempre a subir, estrada serpenteada, com se fosse subindo degrau a degrau, deixando para trás o Norte do País. Aqui já a paisagem, os recursos, até as pessoas eram diferentes, é nisto que viajar de bicicleta marca pontos, as mudanças são feitas lentamente, e via e sentia isso na perfeição.

Os quilómetros passavam lentamente (até cheguei a pensar que o GPS estava avariado), aumentava a altitude e o tempo piorava. Passei por algumas aldeias nos primeiros quilómetros, pareciam desertas (com o tempo assim, em casa ao aquecedor é que se está bem). Sempre que via uma paragem de autocarro ou alguma espécie de abrigo parava um pouco, até porque não sabia quando iria encontrar o próximo e todo o tempo "longe" da chuva e vento sabia como ouro.

Algumas vezes passavam por mim carrinhas de caixa aberta e quase sonhava acordado, com o condutor a parar e a dizer "o senhor viajante por acaso vai para Trancoso e por acaso não quer uma boleia nesta carrinha onde não chove e que tem aquecimento", depois levava com uma rajada de vento e acordava. Adoro viajar, conhecer pessoas novas, lugares novos, viajar de bicicleta, mas em dias como este, o desejo era parar e dizer "já chega, quero chegar com saúde a casa!". O vento cada vez estava mais forte, até mesmo quando (muito raro) apanhava uma descida tinha de pedalar, simplesmente não me deixava andar. Mas devagar, devagarinho lá ia ultrapassando os quilómetros.

Cheguei e parei em Mêda, a maior localidade, intermédia, desta jornada. Cada vez mais alto, cada fez mais a paisagem se aproximava com a paisagem típica da Serra da Estrela. Continuei a parar em cada abrigo, agora as paragens de autocarro eram autênticos bunkers, sempre com vestígios de antigas fogueiras, provavelmente de alguém numa situação parecida com a minha. Com mesmo muito sofrimento, lá cheguei a Trancoso. 

Foi um alívio imenso que senti, quando avistei Trancoso, esta jornada parecia interminável e temi seriamente por mim, e também pelo sucesso de toda a viagem. Foi o dia que mais sofri de todas a viagens que já fiz. Mas o nosso corpo e o nosso cérebro são fabulosos (quem inventou isto, fê-lo bem), quando passava pelo centro Trancoso, já longe de um autêntico "cabo das tormentas" que ultrapassei, parecia que quase nada se tinha passado. Desfrutava, apesar da chuva, das vistas que a cidade de Trancoso me oferecia. Mas o tempo não dava para muito mais e encaminhei-me para o Hotel Turismo de Trancoso. Mais uma vez (tenho muita sorte), fui muito bem recebido. Apesar de este ser um alojamento muito mais "industrializado", em comparação com os meus alojamentos anteriores, senti o mesmo calor humano por parte de quem me recebeu (até me emprestaram um aquecedor para secar a minha roupa, que apesar dos esforços, não secou de tão molhada que estava). Continuava a chover e já não sai do Hotel, jantei no restaurante do hotel e segui directamente para a cama. Estava exausto. Tive pena de não sair, para conhecer melhor Trancoso. Pareceu-me uma cidade bem interessante, envolvida por uma muralha e pertencente à rota das Aldeias Históricas. Mais uma vez foi fundamental a qualidade do alojamento, para recuperar o corpo e a mente, o Hotel Turismo de Trancoso cumpriu o seu papel na perfeição.

Carlos Bernardo

Nascido e criado em Abrantes, onde vive e nunca desejou ser de outro lugar. Apesar disso adora viajar. Mais do que uma foto de viagem, gosta de uma boa conversa. Criou o blog O Meu Escritório é lá Fora! em 2013. Foi nomeado para melhor Blog de Viagens Pessoal, no BTL Travel Blogger Awards, e considerado como um dos 10 melhores blogs de viagem nacionais.

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