(crónica de Nuno Gil)
Com esta
crónica irei dar continuidade à reflexão sobre a figura do treinador. Depois de
anteriormente ter escrito sobre “quem é o treinador” irei, agora, escrever
sobre as responsabilidades do treinador.
O cargo
de treinador e em especial o de treinador de jovens, é um cargo que tem grandes
responsabilidades associadas ao mesmo. Responsabilidades essas, que de acordo
com Adelino et al. (1999), são as seguintes: responsabilidades de natureza social, responsabilidades de natureza
jurídica e que se encontram regulamentadas pela lei de bases do sistema desportivo
português, na qual se destaca que a prática desportiva tem como objectivos
base, a educação e formação dos jovens de forma a promover o seu
desenvolvimento geral (físico, psicológico e social); a noção de
responsabilidade e o espírito de solidariedade e de cooperação; a formação
cívica e ética; e a saúde; responsabilidades
face ao sistema desportivo, porque as características da formação e da
preparação dos jovens influenciam a qualidade dos desportistas e, por
consequência, a qualidade do próprio sistema desportivo. Assim, e de acordo com
os mesmos autores, o treinador deve ter a consciência que toda a sua intervenção
quer ao nível do treino, quer ao nível da competição deve servir para que haja
mais e melhores praticantes; responsabilidade
face aos praticantes, expressa pela necessidade do treinador dever estar
consciente que a preparação desportiva dos jovens que ele dirige, deve
respeitar as etapas de crescimento e maturação do jovem, isto é, deve respeitar
o desenvolvimento biológico do jovem, evitando, situações que possam prejudicar
o normal processo de desenvolvimento do jovem praticante. Adelino et al.
(1999), referem ainda, que tendo em conta que os jovens aprendem a maior parte
dos seus comportamentos, atitudes e valores principalmente por ação dos adultos
e por todas as vivências que estes lhes proporcionam, o treinador tem
responsabilidade acrescida na formação dos jovens, não só no campo desportivo
como também no campo social e de cidadania.
No que
respeita à aprendizagem dos comportamentos e atitudes por parte dos jovens, o
treinador tem que ter especial atenção, pois ele é uma figura modelo para todos
aqueles que consigo trabalham, desde dirigentes, pais, espectadores e, especialmente, os atletas. Para Barata (1999) citado por Pacheco (2001), o
treinador deve ser um bom exemplo e um bom modelo para o jovem praticante
desportivo, dado que os jovens se encontram na fase de formação da sua
personalidade e de aquisição de valores e referências que serão fundamentais na
sua vida futura.
Parece não existir dúvidas, que quem assume o cargo de treinador deveria estar
consciente que este é um cargo de extrema responsabilidade, principalmente
quando se treinam jovens, em fase de
desenvolvimento motor e de formação da personalidade e de aquisição de valores
que o guiaram no seu futuro, não só como desportista, mas também e
essencialmente como ser humano e cidadão.
Contudo,
e infelizmente, ainda se vê muitos “treinadores” que não tem a noção do seu
papel nesta formação integral do jovem, pensando que os jovens são meras peças
de xadrez que estão ali à sua disposição e que ali estão apenas para serem
grandes campeões na modalidade que escolheram ou que lhes foi imposta por
alguém, tendo muitos desses “treinadores” uma intervenção ao longo dos treinos
e da competição que em nada promove uma normal e saudável formação desportiva,
pessoal, cognitiva, social e psicológica, intervenções estas, que muitas vezes
ultrapassam todos os limites do civismo e da ética. Não sendo raro ver um
treinador dirigir-se em termos menos próprios para os seus atletas, árbitros e
mesmo adversários.
Também
espelhando a má formação que infelizmente ainda se pratica, não é raro ver um
treinador a dizer ao seu jovem atleta: “passa a bola, não passa o jogador”, ou
elogiar um comportamento deste tipo para colegas do jovem que tem tal conduta. É
ainda usual ver treinadores, por não saberem o que fazer, quando fazer e como
fazer, colocarem em causa a integridade física dos seus atletas a curto e longo
prazo, apenas e só por reproduzirem o treino dos adultos nas crianças.
Também
muitas vezes é esquecido o papel de modelo para os jovens que os treinadores
têm e por vezes dá-se-lhes exemplos de condutas, atitudes e valores que não
devem ser modelo para ninguém. Também existe o caso de se dizer uma coisa e
fazer outra e depois pedir-se aos jovens para “olhar para o que digo e não para
o que faço”, estando assim a pedir-lhes uma coisa difícil que é ignorar um
modelo de referência que ele tem.
Termino,
justificando as minhas crónicas com a necessidade de agitar consciências, pois
existem duas alternativas: deixar como está ou mudar para melhor e infelizmente
por falta de reflexão conjunta e procura de melhoria, parece-me que muitas
vezes está a seguir-se o caminho mais fácil, o do deixar andar.
Votos
de um bom ano de 2015. Saudações desportivas e até à próxima crónica.
Nota final - o autor da crónica disponibiliza a literatura
referenciada a quem o solicitar.
Nuno Gil
Licenciado em ciências do desporto, pela FCDEF-UC
Mestre em treino do jovem atleta, pela FMH-UTL
Doutorando em ciências do desporto, na FCDEF-UC
Professor de educação física, na escola secundária Dr. Manuel Fernandes
Ex-treinador desportivo
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