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quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

Treinador: muito mais do que um simples conhecedor da modalidade


(crónica de Nuno Gil)

Depois de terminar a exposição sobre a primeira etapa do Long-term athlete development – LTAD, vou escrever o primeiro de vários artigos sobre aquele que considero ser o principal agente de promoção de sucesso de qualquer projeto desportivo, o treinador.

Mas afinal o quem é treinador?

Bem, se treino é o processo que tem como objectivo desenvolver as capacidades de trabalho do organismo, provocando modificações progressivas a diferentes níveis, tais como fisiológicas e funcionais (Raposo, 2001), então treinador será a pessoa que guia todo este processo.

Assim o treinador, quer seja de adultos, quer seja de jovens, é alguém com funções importantíssimas no processo de treino, que segundo a Cartilha da prática desportiva juvenil referenciada por Adelino, Vieira, & Coelho (1999), deve ter uma formação qualificada e adequada.

De acordo com Pacheco (2001), o treinador não deverá continuar a ser o antigo praticante sem qualquer tipo de formação e que apenas se limita a aplicar a sua experiência na organização e direcção dos treinos. O treinador deverá então ser uma pessoa com formação e que domine o saber, o saber fazer e o saber fazer com que os outros façam. O treinador deve ser uma pessoa com conhecimentos sólidos sobre o desporto e a modalidade em causa, que goste de trabalhar, que consiga estabelecer uma boa relação com os jovens, que conheça as diferentes fases do desenvolvimento dos jovens, e que conheça os métodos e meios mais ajustados ao desenvolvimento integral dos jovens.

Castelo & Barreto (1996) referem que o treinador deverá ser uma pessoa com as seguintes características: ser um técnico especializado de uma dada modalidade conhecendo as suas diferentes dimensões; seja um condutor do processo pedagógico que é o treino; seja um gestor de recursos humanos; e que seja um elemento que contribua, obrigatoriamente, para a valorização, desenvolvimento e formação da comunidade desportiva que lhe está subjacente.

Sem dúvida que para ser treinador, é necessário muitas coisas, conforme referido anteriormente, contudo no que respeita, às qualificações de quem orienta o processo de treino, isto é, o treinador, este é um tema bastante complexo, pois hoje em dia, e infelizmente, em muitos casos, qualquer um é “treinador”, para isso basta que vista um fato de treino e coloque um apito ao pescoço, e os jovens, inocentemente, e os pais, inconscientemente, já lhe chamam treinador ou mesmo professor.

E é assim que se cometem verdadeiros atentados à formação desportiva e não só, dos nossos jovens, quando pessoas sem qualquer habilitação ou formação mínima, são responsáveis por um processo que é bastante complexo, e cuja operacionalização não é uma atividade inconsequente ou inócua, na formação integral do praticante enquanto individuo.

A prática desportiva produz alterações no praticante, visíveis e mensuráveis: quer ao nível das estruturas orgânicas, quer ao nível das capacidades motoras e funcionais, quer ainda ao nível da personalidade. Assim, a atividade desportiva juvenil deverá ser corretamente orientada de forma a proporcionar aos praticantes um desenvolvimento integral e ajustado ao seu desenvolvimento natural, isto é, deverá sempre organizar-se como um processo que favoreça a descoberta e a estimulação das capacidades e qualidades destes, de modo a que ao longo da sua evolução natural nada se faça que coloque em causa o crescimento e o desenvolvimento, quer das estruturas orgânicas quer das capacidades motoras e funcionais, quer ainda das qualidades determinantes da personalidade de cada praticante. É dentro desta perspectiva que os dirigentes, os pais e principalmente os treinadores dos nossos jovens praticantes devem conduzir o seu modo de estar e encarar as atividades desportivas.

Movimento, esforço, prazer, divertimento, desafio, confronto, e mesmo alguma formalização, padronização e rendimento, são ingredientes que devem ser sábia e prudentemente doseados. Caso não o sejam, corremos o risco de deformar e não de formar, que é o que provavelmente acontece em muitos casos, em que as equipas não são orientadas por treinadores, mas sim por curiosos a quem os clubes recorrem por falta de capacidade para ter treinadores, alguns deles apenas porque foram ex-atletas e julgam ter todos os conhecimentos necessários para poderem treinar nas diferentes modalidades, o que no caso do treino de jovens é ainda mais alarmante, pois na generalidade dos casos desconhecem as diferentes fases de desenvolvimento dos jovens e limitam-se a fazer do treino dos jovens uma cópia daquilo que foi ou ainda é o seu treino como adultos.

Termino, deixando uma afirmação, para reflexão: o treinador está para o atleta, como o médico está para o paciente e como o professor está para o aluno.

Saudações desportivas e até à próxima crónica.

Nuno Gil
Licenciado em ciências do desporto, pela FCDEF-UC
Mestre em treino do jovem atleta, pela FMH-UTL
Doutorando em ciências do desporto, na FCDEF-UC
Professor de educação física, na escola secundária Dr. Manuel Fernandes
Ex-treinador desportivo

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