(crónica de Sofia Loureiro)
Com o início do ano escolar e o
trabalho de organização e motivação, que me é hábito fazer com crianças e
jovens que tenho em acompanhamento terapêutico, confrontei-me com as reflexões
que decidi aqui partilhar. Ao fim de tantos anos de trabalho e tantas mudanças
no sistema educativo e da sociedade em geral, algo se mantém… a quantidade de
crianças e jovens que referem pouco investimento nas aulas de Educação Física e
aqueles que têm vários tipos de motivos “justificados” para faltar às aulas,
falando nisso mesmo antes do ano letivo começar. Ressalvo aqui que não me
refiro a situações em que comprovadamente a criança ou o jovem têm algum
problema de saúde, que os impossibilita temporária ou permanentemente da
prática desportiva ou de esforço físico.
Falo de jovens que não encontram
prazer e desvalorizam os conhecimentos ou competências adquiridos nesta
disciplina, usando depois razões mais ou menos válidas para poderem de forma
justificada faltar às aulas. Se bem que a maioria das crianças e jovens gostem da
disciplina, pelo facto de a associarem a uma maior liberdade e distração, certo
é que existem alguns outros/as que são pouco participativos e procuram a
dispensa das aulas.
As reflexões e leituras que tenho
feito sobre este assunto, dividem-se em dois grandes aspetos. Por um lado, sistematizar
o que pode estar associado a este desinteresse, sem ter atitudes mais
discriminatórias e apontar logo o dedo e rotular estes/as alunas como
“preguiçosos” e “parados”. Por outro, encontrar estratégias para motivar estas
crianças/jovens a frequentar as aulas, atendendo à importância que esta
disciplina tem, não só para o desenvolvimento psicomotor e cognitivo, mas
também pelo facto de poder ser a melhor oportunidade do sistema de educação
formal para promover a interiorização da relevância da prática de exercício
físico para a saúde e qualidade de vida.
São muitos os fatores subjacentes
ao desinvestimento e “absentismo” às aulas de Educação Física e muitos os
especialistas na matéria que já estudaram o tema. Existem as características
individuais e as mudanças biopsicossociais que acontecem ao longo do
desenvolvimento humano, nomeadamente na passagem da infância para a
adolescência e que contribuem para uma diminuição da atividade física. Mas
salientaria aqui aspetos como o facto de alunos/as considerarem as aulas pouco
interessantes, repetitivas ao longo dos anos letivos, terem a noção do
“insucesso” mais exposto aos olhos do grupo e de serem valorizados pelos
professores os alunos “naturalmente” dotados para a prática desportiva. O
interessante é perceber que alguns destes jovens que não querem fazer Educação
Física por vezes praticam uma qualquer modalidade desportiva fora da escola…
No segundo e último momento
destas reflexões e procurando um ou vários caminhos para uma mudança na adesão
destas crianças e jovens para a frequência assídua das aulas de Educação
Física, começaria por destacar que o importante seria começar por conseguir
estimular o espírito de grupo e das boas relações entre alunos. Por outro lado,
adotar estratégias pedagógicas que proporcionem momentos de prazer à maioria dos/as
alunos/as, mas também de sucessos face aos níveis de competências individuais de
cada um/a tendo em atenção os níveis de dificuldade associados. Não menos
relevante e prática chave para a motivação (ainda que cumprindo os currículos
de cada ciclo escolar) seria a procura pelos/os professores em variar as
atividades, as temáticas a abordar e não valorizar demasiado a competitividade
mas antes o espírito de interajuda, respeito e alegria. Esta é a disciplina
onde mais facilmente se podem proporcionar momentos para abordar de forma
descontraída, assuntos como a preocupação com o corpo/padrões de beleza e
aparência, a sexualidade, hábitos alimentares e que sabemos ocupar parte dos
pensamentos das crianças e jovens.
Conhecendo todos os
constrangimentos que rodeiam o ato de ser professor/a e as cada vez mais
exigentes burocracias do contexto educativo formal, não deixo de acreditar que
se pode fazer a diferença com pequenos movimentos individuais. Acredito que se
podem motivar os/as alunos/as aparentemente com maior grau de passividade nas
aulas de Educação Física, procurando ir ao seu encontro, das suas dificuldades
e interesses, das suas capacidades e dos seus receios, tornando-os/as
progressivamente mais participativos/as e mais capazes de se auto determinarem
de forma saudável no presente e no futuro.
Sofia Loureiro
Psicóloga Clínica
Licenciada em Psicologia pela Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade do Porto
Pós graduada em Psicoterapia Comportamental e Cognitiva
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