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quinta-feira, 5 de novembro de 2015

Prevenir o desistir


(crónica de Sofia Loureiro)

Ao longo da vida todos nós desistimos de várias coisas, às vezes é força, outras fraqueza, mas tem sempre subjacente, muitas razões que maioritariamente insistimos em não querer ver. Sabemos por experiência comum, que conhecemos inúmeras pessoas que desistem da prática de modos de vida saudável, em particular do exercício físico regular. Uns ao fim do primeiro mês, outros meses depois… Entre adultos a principal justificação apontada é … o tempo, ou antes, a falta dele.

Já noutros momentos, por um ou outro tema, me referi à motivação. Conceito aparentemente simples e que usamos de forma corrente no nosso quotidiano. Mas, de simples, nada tem e por isso se insiste que para se fazer exercício físico com continuidade é necessário motivação.

Manter uma dieta alimentar correta, alterar rotinas e hábitos de vida para melhorar a qualidade de vida e praticar exercício físico tem na sua base acima de tudo a motivação. Aquilo que nos faz iniciar e manter uma atividade física e o que nos leva a desistir da sua prática, tem estado na base de inúmeros estudos. Mas, se relativamente aos adultos, nos preocupa esta “desistência resistente”, é sobre os jovens que me quero debruçar na crónica de hoje.

O percurso de um praticante de desporto em qualquer modalidade, ou na maioria delas, é considerado curto e por isso se tem vindo a apelar que quanto mais cedo a criança ingressar na base, melhor terá probabilidade de alcançar o sucesso ou mesmo o profissionalismo. O que na realidade nem sempre corresponde!

Ainda assim, dos muitos milhares de crianças que iniciam uma modalidade desde a sua base, poucos alcançam um nível profissional e poucos/as também são os/as que experimentam sucesso e sentido de eficácia. Verificamos que muitos jovens acabam por desistir da prática desportiva, não só por todo o processo (naturalmente) seletivo de praticantes/atletas que se rodeia de características de grande exigência, pressão, stress e competitividade, mas também pela consequente ou relacionada incapacidade pessoal/familiar do jovem para corresponder a tais parâmetros.

Para a estabilidade e continuidade na prática desportiva, as crianças e jovens para além de características motoras particulares, tem que conseguir desenvolver qualidades técnicas específicas, mas também cognitivas e emocionais (atenção, resolução de problemas, definição de objetivos realistas, resiliência, etc).  Ainda que desde cedo, as crianças passem muito tempo a praticar uma qualquer modalidade, muitas vezes o seu esforço não é compensado e a sua motivação depressa é ameaçada e a palavra “desistir” a inculcar-se no pensamento. O abandono da prática desportiva é pois um assunto sério e que deve ser pensada por todos… pais e mães, treinadores, professores de educação física, psicólogos, entre outros.

Deveremos ter em atenção os desejos, as expetativas, os ideais da criança e do jovem. Mas também aquelas expetativas que lhe são incutidas, mas que não correspondem de facto às suas, mas a outros significativos (pais, irmãos, professores…) e que contrariam a sua identidade em formação.

Quanto mais a criança ou o jovem se encontrarem conscientes dos seus próprios ideais, sonhos e das suas competências, mais motivados poderão estar. No fundo, a motivação equivale a um estado interior, emocional, que desafia o interesse e a ativação para uma qualquer atividade. Se uma criança/jovem se encontrar emocionalmente envolvido, aciona-se, tem um objetivo, uma direção a seguir e vai manter-se mais facilmente nesse caminho, mesmo perante dificuldades e obstáculos.

Sabe-se da análise de dados que alguns dos principais motivos para a manutenção da prática desportiva após os primeiros anos são o prazer que é proporcionado, o sentimento de realização pessoal, o sucesso ou a procura dele, o desafio de se superar e atingir melhores resultados e claro, o gosto pela competição. Em síntese, todos estes fatores estão relacionados com fatores motivacionais chamados intrínsecos, ou por outras palavras, que vem de dentro, do próprio.    

Na realidade, a “diversão” é mais valorizada pelas crianças e jovens que a própria “técnica”, o que nem sempre é valorizado pelos adultos com responsabilidade na vida destes pequenos atletas e refiro-me a pais, professores e treinadores. Por seu lado, os mesmos estudos apontam como principais razões para o abandono da prática desportiva (que ocorrem em média entre os 12 -17 anos), a conciliação com a escola/estudos, outros interesses que entretanto surgiram, falta de tempo para estar com amigos e a falta de diversidade dos treinos/monotonia, associada também à falta de diversão nos treinos.

Estes dados deverão servir para refletirmos - professores da educação física, treinadores, outros profissionais e pais – para promover a motivação, interesse e envolvimento de acordo com os interesses e mudanças naturais na vida de cada criança e jovem, procurando assim diminuir as taxas de desistência da prática desportiva regular. 

Sofia Loureiro
Psicóloga Clínica
Licenciada em  Psicologia pela Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade do Porto 
Pós graduada em Psicoterapia Comportamental e Cognitiva

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