(crónica de Sofia Loureiro)
Ao longo da vida todos nós desistimos de várias coisas, às vezes é força,
outras fraqueza, mas tem sempre subjacente, muitas razões que maioritariamente
insistimos em não querer ver. Sabemos por experiência comum, que conhecemos
inúmeras pessoas que desistem da prática de modos de vida saudável, em
particular do exercício físico regular. Uns ao fim do primeiro mês, outros
meses depois… Entre adultos a principal justificação apontada é … o tempo, ou
antes, a falta dele.
Já noutros momentos, por um ou outro tema, me referi à
motivação. Conceito aparentemente simples e que usamos de forma corrente no
nosso quotidiano. Mas, de simples, nada tem e por isso se insiste que para se
fazer exercício físico com continuidade é necessário motivação.
Manter uma dieta alimentar correta, alterar rotinas e
hábitos de vida para melhorar a qualidade de vida e praticar exercício físico tem
na sua base acima de tudo a motivação. Aquilo que nos faz iniciar e manter uma atividade
física e o que nos leva a desistir da sua prática, tem estado na base de
inúmeros estudos. Mas, se relativamente aos adultos, nos preocupa esta
“desistência resistente”, é sobre os jovens que me quero debruçar na crónica de
hoje.
O percurso
de um praticante de desporto em qualquer modalidade, ou na maioria delas, é
considerado curto e por isso se tem vindo a apelar que quanto mais cedo a
criança ingressar na base, melhor terá probabilidade de alcançar o sucesso ou
mesmo o profissionalismo. O que na realidade nem sempre corresponde!
Ainda assim,
dos muitos milhares de crianças que iniciam uma modalidade desde a sua base, poucos
alcançam um nível profissional e poucos/as também são os/as que experimentam
sucesso e sentido de eficácia. Verificamos que muitos jovens acabam por
desistir da prática desportiva, não só por todo o processo (naturalmente)
seletivo de praticantes/atletas que se rodeia de características de grande
exigência, pressão, stress e competitividade, mas também pela consequente ou
relacionada incapacidade pessoal/familiar do jovem para corresponder a tais
parâmetros.
Para a
estabilidade e continuidade na prática desportiva, as crianças e jovens para além
de características motoras particulares, tem que conseguir desenvolver
qualidades técnicas específicas, mas também cognitivas e emocionais (atenção,
resolução de problemas, definição de objetivos realistas, resiliência, etc). Ainda
que desde cedo, as crianças passem muito tempo a praticar uma qualquer
modalidade, muitas vezes o seu esforço não é compensado e a sua motivação depressa
é ameaçada e a palavra “desistir” a inculcar-se no pensamento. O abandono da
prática desportiva é pois um assunto sério e que deve ser pensada por todos…
pais e mães, treinadores, professores de educação física, psicólogos, entre
outros.
Deveremos
ter em atenção os desejos, as expetativas, os ideais da criança e do jovem. Mas
também aquelas expetativas que lhe são incutidas, mas que não correspondem de
facto às suas, mas a outros significativos (pais, irmãos, professores…) e que contrariam
a sua identidade em formação.
Quanto mais
a criança ou o jovem se encontrarem conscientes dos seus próprios ideais,
sonhos e das suas competências, mais motivados poderão estar. No fundo, a motivação
equivale a um estado interior, emocional, que desafia o interesse e a ativação
para uma qualquer atividade. Se uma criança/jovem se encontrar emocionalmente
envolvido, aciona-se, tem um objetivo, uma direção a seguir e vai manter-se
mais facilmente nesse caminho, mesmo perante dificuldades e obstáculos.
Sabe-se da
análise de dados que alguns dos principais motivos para a manutenção da prática
desportiva após os primeiros anos são o prazer que é proporcionado, o
sentimento de realização pessoal, o sucesso ou a procura dele, o desafio de se
superar e atingir melhores resultados e claro, o gosto pela competição. Em
síntese, todos estes fatores estão relacionados com fatores motivacionais
chamados intrínsecos, ou por outras palavras, que vem de dentro, do próprio.
Na realidade, a “diversão” é mais valorizada pelas crianças e jovens que a
própria “técnica”, o que nem sempre é valorizado pelos adultos com
responsabilidade na vida destes pequenos atletas e refiro-me a pais,
professores e treinadores. Por seu lado, os mesmos estudos apontam como
principais razões para o abandono da prática desportiva (que ocorrem em média entre
os 12 -17 anos), a conciliação com a escola/estudos, outros interesses que entretanto
surgiram, falta de tempo para estar com amigos e a falta de diversidade dos
treinos/monotonia, associada também à falta de diversão nos treinos.
Estes dados
deverão servir para refletirmos - professores da educação física, treinadores,
outros profissionais e pais – para promover a motivação, interesse e
envolvimento de acordo com os interesses e mudanças naturais na vida de cada
criança e jovem, procurando assim diminuir as taxas de desistência da prática
desportiva regular.
Sofia Loureiro
Psicóloga Clínica
Licenciada em Psicologia pela Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade do Porto
Pós graduada em Psicoterapia Comportamental e Cognitiva
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