(crónica de Nuno Gil)
O
treinador é um ser humano e como todos os seres humanos tem personalidade e motivações
próprias.
Todos
os treinadores na sua qualidade de seres racionais têm objectivos. Objectivos
esses que resultam da sua filosofia de vida e mais especificamente da sua
filosofia de treino.
De
acordo com Martens (1998; 2002), uma das decisões mais importantes que o
treinador toma é a definição dos objectivos para os seus atletas, e que se
podem dividir em três objectivos gerais: ter uma equipa ganhadora; ajudar os
jovens a divertir-se na atividade; ajudar os jovens a desenvolver-se
fisicamente, psicologicamente e socialmente.
Então,
a grande questão que se levanta é saber qual destes objectivos é o mais
importante para o treinador e para o bem dos atletas, podendo também haver uma
conciliação de mais que um objectivo, embora segundo o mesmo autor por vezes os
objectivos entram em conflito, o que se pode tornar perigoso, principalmente em
idades mais jovens. Por o exemplo, treinadores que no seu discurso dizem que o
seu objectivo principal é ajudar os jovens a desenvolver-se a nível físico,
psicológico e social, mas quando são observados em situação de treino e competição
verifica-se que o seu objectivo é apenas ganhar.
Para
Adelino et al., (1999), os objectivos que o treinador de jovens deve ter em
conta são os seguintes: contribuir para a formação do jovem em todas as suas
facetas; criar as premissas indispensáveis para os jovens alcançarem, em cada
etapa, o nível óptimo do seu desenvolvimento; desenvolver o gosto e o hábito da
prática de atividades físicas habituais; desenvolver nos praticantes uma
atitude positiva de participação e persistência; orientar corretamente as
expectativas dos jovens.
Não
tenho dúvidas que quanto mais baixo for o escalão etário dos jovens
desportistas, mais importante são os objectivos apresentados por Adelino et al.
(1999) e mais sentido faz orientar a sua equipa ou atleta de acordo com o
objectivo de os jovens atletas se divertirem ao máximo e de sentirem prazer
naquilo que fazem e paralelamente procurar desenvolver fisicamente,
psiquicamente e socialmente os jovens de Martens (1998; 2002).
Nestas
idades não se deve dar grande ênfase à vitória mas sim a todos os outros
objectivos apresentados. Contudo não é difícil ver treinadores com um discurso
e principalmente com atitudes que reforçam o exemplo negativo dado por Martens
(1998; 2002), julgando eu que se formos para a observação em situação de
competição esta situação é ainda mais visível, quer por parte dos treinadores,
quer por parte de diretores e até de alguns pais. Sendo que ao nível da
competição e no meu caso particular que trabalhei com jovens de idades
inferiores a 10 anos, na modalidade de futebol, era e é, infelizmente, normal
ver treinadores (muitos deles sem qualquer formação) exigir aos miúdos
comportamentos típicos de adultos e falarem com os mesmos como se estes fossem
adultos, e pior, como se aquele jogo fosse o último jogo da vida deles, em que
utilizam apenas os melhores, ficando aqueles com mais dificuldades todo o tempo
de jogo no banco, muitas vezes à chuva e ao frio, sem sequer ter o prazer de
jogar alguns minutos, apenas porque o treinador quer ganhar o jogo a todo o
custo. Havendo também casos em que apenas se limitam explorar as capacidades
dos mais dotados, por vezes de uma forma abusiva e prejudicial ao próprio
atleta, para ganharem o jogo, não lhes ensinando nada mais e deixando de parte
os outros jovens que ainda necessitam de aprender e adquirir muito competências
e habilidades, colocando assim grandes barreiras no desenvolvimento destes
jovens, levando-os muitas vezes a um abandono precoce da prática desportiva.
Termino
pedindo a todos treinadores que lerem esta crónica para se questionarem a si
próprios: Quais os meus objetivos enquanto treinador? Estão esses objetivos
adaptados aos atletas/grupo que treino?
Saudações desportivas e até à próxima crónica.
Nota final - o autor da crónica disponibiliza a literatura
referenciada a quem o solicitar.
Nuno Gil
Licenciado em ciências do desporto, pela FCDEF-UC
Mestre em treino do jovem atleta, pela FMH-UTL
Doutorando em ciências do desporto, na FCDEF-UC
Professor de educação física, na escola secundária Dr. Manuel Fernandes
Ex-treinador desportivo
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